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segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Harry Potter, Crepúsculo e Funk

Tempos atrás realizei alguns comentários sobre literatura (também cinema) masculina e feminina. Não havia percebido a profunda relação entre aquela reflexão e o funk. Como morador de Itaquera, zona leste de São Paulo, convivo dia e noite com os consumidores deste gênero musical e seus padrões de comportamento. Que determinados rapazes, dados os valores e inclinações que possuem, se identificassem com o funk em nada me surpreendia, porém, não conseguia entender como mulheres poderiam ser minimamente cativadas por uma música, companhia e ambiente que apenas as subestima, vulgariza e humilha. Foi então que retornou à minha mente a questão da literatura masculina e feminina.

Em geral (mas não via de regra) há inclinações inconscientes as quais levam os indivíduos a preferir esta ou aquela história. O espírito masculino observa este mundo no qual é mero coadjuvante enquanto anseia pelo momento catártico no qual converter-se-á no herói. Este é o cara que gosta da "A Odisséia", "O Poderoso Chefão", "Harry Potter" ou "O Procurado". O espírito feminino, ainda influenciado por nossa cultura preponderantemente feminista, prefere não enfrentar os sofrimentos de Odisseu; contenta-se em ser escolhido pelo herói, destacado do ordinário pela suposta perspicácia do herói, o qual acaba compartilhando assim sua dignidade. Este espírito consome "Crepúsculo", “50 tons de cinza" e "Uma linda mulher". Observe-se, porém, que não se trata de uma distinção entre gêneros ou inclinações sexuais. Não é um exclusivo para homens e outro para mulheres, assim como a presença ou preponderância de um não denota hetero, bi ou homossexualismo. Estou fazendo uma simples separação de padrões artísticos e sugerindo uma possível explicação para a preferência que se tem deste ou daquele.
Tarde percebi que na poesia, logo, também na música, esta interpretação pode ser encontrada.  Seja no samba, Rock, MPB, música sertaneja e outros, sempre há algo com a revolta ou a crítica (o herói lutando), ou o louvor pelo amor correspondido (o êxtase do espírito feminino por ser o escolhido) ou o drama do amor unilateral (o lamento do espírito feminino por não ser escolhido associado à expectativa do espírito masculino por tornar-se o herói, logo, aquele que escolhe). Aqui já começa a surgir pistas do fenômeno "funk" como uma corrupção desta teoria. Ora, eu não leio livros nem ouço músicas com as quais não me identifique. Eu procuro aquilo que me inspira. Aquilo que me ajuda a evidenciar o melhor de mim. Assim como eu, que cresci na periferia, muitos outros de minha geração construíram suas personalidades e valores com grande colaboração da manifestação artística. Hoje, porém, não vejo o jovem da periferia, meu vizinho, buscando força no rock, sensibilidade no samba ou senso crítico no rap. De algum modo, penso, há um declínio em sua confiança na estrutura social, assim, inspira-o não mais Odisseu, mas sim o anti-herói. O marginalizado que ganhava voz com o rap foi trocado pelo marginal que busca conforto no crime. Entenda: Não estou acusando de criminoso cada ouvinte de funk que cruza o meu caminho. A maior parte deles passará a vida sem cometer um único crime, detida por inúmeros agentes inibidores externos e internos. Estou lamentando ser esta a fonte de inspiração deles. Dirão que estou generalizando, que há funk bom. Pode até ser, mas não tive contato com isto. Em meu bairro só se escuta um ininterrupto louvor ao crime e à banalização da sexualidade.
Voltemos às moças; Creio já ter apresentado toda a base teórica que me faz ver nestas meninas a mesma inclinação que havia observado nos consumidores de literatura feminina. Neste mundo de periferia, sem sonhos, ilusões nem heróis, se o herói almejado pelo espírito masculino é o delinquente, é natural que o desejo do espírito feminino seja ser escolhido pelo delinquente. Daí a aceitar submeter-se às intemperanças deste pseudoherói e vir até mesmo a absorvê-las como valores e desejos próprios é um pulo. A emancipação que esta moça acredita obter de seus pais e das limitações econômicas e convenções sociais custa sua submissão à outra ordem de valores, aquela ditada pelo MC.

Preconceito:

Em tempo, já quero deixar registrado um pequeno comentário sobre as acusações de preconceito que receberei. Não são poucos os textos previamente publicados neste canal acerca do preconceito. Fique a vontade para visitar a tag "preconceito" e por ela compreender melhor minha opinião. Por ora informo o seguinte: sou preconceituoso e enquanto viver não deixarei de sê-lo. Não há ser humano que não seja e mente descaradamente quem o nega. Em relação ao funk, tenho a impressão que surgiu nas redes sociais uma nova moda -  mundo humano, construído mais de modas que de moléculas - , a saber, a moda de que você parece mais inteligente e erudito se tratar funk como manifestação cultural e funkeiros como minorias incompreendidas. Bem, sempre desprezei a moda.

6 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Oopa, eis um texto quente!

    Acredito que os supostos defensores do "rolezinho" (eu inclusive), não defendem o ato em si ou o motivo de sua organização.

    O que está acontecendo, EM GRANDE PARTE, é a defesa daquela velha máxima iluminista, salvo engano, proferida por Voltaire: "Sou contra suas ideias, mas morreria pela sua liberdade de as proferir".

    Essa questão mostra o grave problema de que nossos espaços principais de socialização em São Paulo sejam os Shopping Centers! Não há mais o hábito de frequentar praças, um espírito público, um pensamento coletivo. Pior ainda: os padrões sociais vigentes do culto ao indiviualismo, criou uma forma de sociabilidade que é uma verdadeira disputa para ver quem aparece mais, quem é mais "centro de atenção". O resultado já sabemos: música alta, comportamento invasivo, etc.

    Qual a solução? Uma mudança profunda do uso do espaço público. Algo impossível no mundo do individualismo e do culto ao privado.

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    1. Absorveram a cultura da "popularidade" que assistíamos na cessão da tarde, brother?
      Saímos das praças em função da insegurança crescente. Agora alguns transportam a insegurança para o interior dos shoppings e mancham a imagem do todo. Lamento que o tal "rolezinho" tenha acabado com alegria daqueles que só queriam dar um rolê!

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  3. Quanto ao machismo no Funk ostentação e na Cultura em geral, concordo em 100%

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  4. Que analogias sábias e perspicazes, caro Marcelo! Recorreste a um material conhecido ao falar sobre a preferência inconsciente masculina e feminina, apontando, talvez, o elo entre a música a literatura e a postura pessoal.

    Congratulações pelo excelente constructo de seu pensamento!

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