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segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Carma

O carma é tema recorrente em religiões reencarnacionistas  e tem, em  geral, uma interpretação bem  simples. Gostaria de propor, porém, uma outra significação para o termo, a qual não refuta a original, mas que pode expandi-la imensamente.

Carma é geralmente traduzido como "ação" e é utilizado para esclarecer que toda ação tem uma reação. Ele vai além da mera ação e reação física (empurrar algo para frente me empurra para trás), sendo melhor explicado pelo par "causa e efeito", com desdobramentos físicos, mentais, sociais, orgânicos e mesmo espirituais (empurrar algo para a frente pode ferir alguém que a partir daí alimente um profundo ressentimento contra mim por anos e muito tempo depois me reconheça e deixe de me contratar em uma vaga de emprego). Não precisamos ser espíritas, budistas ou hinduístas para falar de carma. Mesmo que não acreditemos em causas em uma vida com efeitos em outra (mesmo que não acreditemos nem mesmo na possibilidade de sequência à vida atual), o carma está o tempo todo a nossa volta, sendo uma impossibilidade lógica a ausência de efeitos a qualquer causa realizável.
No budismo eu aprendi que o carma, dentro da vida humana, se assenta sobre o tripé "Pensamentos + Palavras + Ações", sendo estes os três meios pelos quais agimos (causas) e dos quais, portanto, surgirão efeitos. Este ciclo de causa e efeito é o carma, e embora exista o hábito de usar o termo de forma negativa ("isso só pode ser meu carma mesmo"), o carma em si é neutro, sendo que a natureza dos efeitos (positivo, negativo, benefício, maléfico, etc.) depende diretamente da natureza da causa.
Eu sempre enxerguei este tripé com uma relação meio hierárquica, sendo que para mim os pensamentos criam as palavras e estas associadas àqueles criam as ações. Se há uma hierarquia nas causas também deve haver uma hierarquia nos efeitos, assim, o efeito de algo concretamente realizado deve ser maior que algo apenas dito e este maior que algo só pensado.
Tudo isto deve estar exaustivamente discutido em livros religiosos e não é o foco da presente reflexão. Minha dúvida é se estivemos lendo/interpretando/traduzindo "carma" incorretamente (ou ao menos insuficientemente) o tempo todo.
Ora, sendo carma igual a ação, nos habituamos a tratá-lo como um sinônimo de "minhas ações" e uma máquina que devolve efeitos; efeitos de minhas ações, logo, meu carma. Ora, e se a ação não for só a causa, mas também o efeito? E se a ação não for só minha, mas na verdade o carma representaria a ação em geral?
Explico: vivemos neste universo, que é concreto para uns e maya para outros (Não importa). Este é o único universo conhecido (por enquanto). Em uma interpretação humanizada (e filosofada) da existência, é possível inferir que não há existência se não há quem a perceba. A percepção, por conseguinte, só é possível porque há movimento. É o movimento das partículas constituintes do universo que torna possível a percepção do mesmo pelo agente percebedor. Luz, som, calor, tudo deriva de movimentos de partículas que movimentam outras partículas em nossos órgãos sensoriais que movimentam outras no cérebro que então constrói, também através do movimento de seus elementos constituintes, a imagem ou percepção do objeto. Isto é indiscutível. Falarão de reações químicas e impulsos Elétricos? Tanto faz. Movimentos de elétrons entre átomos, movimento de átomos entre moléculas, sempre movimento. Sem movimento não é possível agente percebedor. Não é possível o ato da percepção. Não há nem mesmo relevância em perceber, já que sendo o universo plenamente inerte (e será um dia, caso não imploda), o tempo deixa de ter relevância, pois aquilo que se perceberia em um minuto de observação seria idêntico ao que se perceberia em cem bilhões de anos. Na verdade sem movimento sequer seria possível falar em tempo, fruto direto das relações de movimento entre os elementos presentes no espaço.
Toda existência tendo sua condição de possibilidade assentada no movimento. Ora, o que me impede repetir toda a explicação acima substituindo o termo "movimento" por "ação"? Disto deriva que a ação, carma, é a condição última (ou primeira) de possibilidade de existência de tudo o que existe. O carma pode, nesta leitura, ser o elemento fundamental da existência. Mesmo se omitirmos o agente percebedor, qualquer que seja, ainda permaneceria o movimento como condição de existência. O que aconteceria com as moléculas se os elétrons interrompessem suas órbitas? Não existe pleno repouso. Mesmo no zero absoluto (que na verdade é só teórico), mesmo na ausência de movimento entre as moléculas ainda existiria o movimento nas moléculas, em seus elementos constituintes. Ação. Carma.
Agora vou ao meu salto metafísico. Como não tenho parte com a academia, faço-o com plena liberdade e até mesmo com deleite. Não cito autoridades anteriores a mim e soluciono lacunas planando sobre elas, usando as correntes ascendentes de minha intuição. O universo é feito de movimento>ação>carma. Em elementos inorgânicos este carma acontece automaticamente. Nos seres orgânicos chamados irracionais isto ocorre segundo programas de DNA (plantas, fungos e demais formas de vida sem sistemas nervosos mais complexos) ou por instinto (animais em geral). Nos seres humanos o carma ocorre de forma mais complexa, dada a existência de infinitas nuances que explicamos com recursos como racionalidade, inclinações, espontaneidade, liberdade, imprevisibilidade, inconsciente, etc. Então temos uma existência cármica geral (tudo é feito intrinsecamente de movimento>ação>carma), existências cármicas mais específicas, que são as ações mais ou menos livres vistas nos animais e que extrapolam a mecânica e química elementares bem como as simples programações de DNA e, finalmente, as existências cármicas extremamente refinadas da vida humana. Tudo é feito de carma, propus agora pouco. Mas o carma é produzido por uma evolução ascendente e hierárquica de atividades racionais, os pensamentos, as palavras e as ações. Ora, e se nossa existência cármica tão refinada, que cria carma racionalmente por pensamentos, palavras e ações fosse capaz de, daí, criar qualquer carma, e não apenas os limitados efeitos que eu chamo de "meu carma"? Carma em geral. Ação em geral. Movimento em geral. Existência. É grande o volume de religiões que atribuem à palavra a origem da existência. Fiat. E se isto não fosse meramente figurativo, mas sim uma indicação clara da relação cíclica e interdependente de nossa existência interna (Pensamentos), nossa existência individual externa (palavras e minhas ações) e a existência externa geral (carma como substrato do universo)?
E se os mantras e rezas de tantas religiões, palavras mágicas das mais diversas formas de ocultismo e tantas outras práticas humanas pelas quais se tenta pela palavra intervir no ambiente não estejam de todo equivocadas, mas são na verdade manifestações intuitivas de uma forma mais elementar de relacionamento com os fenômenos? "Sois deuses!", Está escrito em certo livro sagrado. E se formos? Li certa vez que a mesma palavra sânscrita para "sílaba" foi usada para definir Brahma. Noutro canto se diz que "No princípio era o Verbo e o Verbo era Deus.". Quem sabe?
Somos todos centros de ação (carma)  mais ou menos livres construindo o mundo ao nosso redor a partir de nossas ações, virtualmente criando-o, mas e se esta ação for mais profundo que o mero moldar com as mãos. E se nosso carma por meio e origem do carma em geral, da existência em geral? Jó (Bíblia) chega a dizer "Aquilo que temo me sobrevém, e o que receio me acontece". Será que é apenas uma descrição poética do sofrimento ou uma relação direta entre a mente e o ambiente? Somos todos centros cármicos, ou seja, centros de ação, e o mundo é uma sopa cármica, toda uma existência fundada na ação. Talvez esta relação seja mais profunda que aquela diretamente dependente do estender de minhas mãos (para manusear o mundo). Talvez a compreensão mais profunda do carma seja o caminho real para o "abracadabra".

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