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sábado, 17 de novembro de 2018

A Voz de Deus

     Estava ouvindo algumas músicas que tenho, herança de meu passado cristão (católico). Músicas que então me inspiravam e hoje não menos. Ouvindo-as pensei no passado e presente da chamada "Revelação Divina", consequentemente, pensei no presente e futuro da voz de Deus.

     Estas belas canções, cujo conteúdo muito me alegra e agrada, seja pela desenvoltura poética, seja pela mensagem espiritual e mesmo pela melodia, são criadas por uma fórmula muito específica: Elas nascem da leitura direta ou adaptada do texto sagrado (no exemplo que usarei, a Bíblia), ou seja, têm como sementes fragmentos da revelação divina. Um fragmento é, por definição, um pedaço muito pequeno de algo, logo, insuficiente para criar uma coisa inteira. Isso significa que, apanhados alguns fragmentos, o músico/compositor/poeta/ministro de música tem uma imensa cadeia de lacunas para preencher.
     O processo de preenchimento se dá por meio da criatividade do sujeito, embebida em licença poética. Para exemplificar, neste momento escuto Fábio de Melo (na época não padre) representando Jesus quê diz, na canção "Se você trouxer pra mim a sua água eu devolvo vinho". ( "Mais Perto"). O fragmento é evidente, As Bodas de Canaã. A licença poética é atribuir a Jesus algo que ele mesmo nunca disse. É pecado? Sacrilégio? Claro que não. É, no mínimo, feliz criatividade.
     Uma canção bem feita, quando escutada por um cristão praticante é chamada "ungida", assim como é ungido quem a compõe e/ou executada. Ser ungido é ser inspirado por Deus. Se foi Deus quem inspirou, então o que ali se diz é o que Deus gostaria de dizer. Hoje eu sei que o compositor é o Fábio. Daqui algumas décadas, talvez as pessoas a cantem sem certeza do compositor, como mesmo hoje cantamos muitas canções de autoria desconhecida (pelo menos da maioria do público).
     Com o tempo, mesmo perdido o nome do autor, não se perderá a beleza, a ideia de ser uma canção ungida, inspirada por Deus. Muito tempo depois, séculos talvez, nada impediria a total perda da ideia de "Deus poderia ter desejado dizê-lo" e sua substituição por "Deus o disse!".
     Se eu fui capaz de me fazer entender, você compreendeu um sutil processo pelo qual algo com fragmentos de revelação divina e baldes de criatividade humana se converte lentamente em revelação divina pura. Se é assim, o que impede que aquilo ora tomado como pura revelação tenha sido no passado remoto uma livre e desinteressada composição humana salpicada de revelações ainda mais antigas?
     Esta reflexão não tem por objetivo o enfraquecimento da fé alheia, pelo contrário, quer mostrar que somos co-autores da revelação divina, cada qual em si um fragmento do divino, um sub-tom da voz primordial. Não há diferença entre poeta e profeta, sendo, portanto, menos uma questão mística que de sensibilidade e perspicácia. Estar aí para ver Deus nos fragmentos e ser a mão que preenche as brechas com a sutil matéria do espírito humano, que nada deve ao divino.

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