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segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Meu olhar sobre o Evangelho - Ofensa a Jesus

Eu não acredito em Deus, mas não preciso desta crença para considerar verdadeira a passagem de Jesus por este mundo. Eu não creio que Jesus tenha sido filho de Deus ou parte da santíssima trindade, mas não necessito disto para considerar magnífico o que ele tinha para ensinar. A reflexão que segue não é uma tentativa de refutar as crenças alheias, mas antes, o compartilhar de uma idéia simples: Quem crê em Jesus o ofende profundamente ao praticar esta fé nos moldes que ela adotou.

Vou me inserir no interior de três hipóteses muito simples ¹ e amplamente aceitas como fatos:
a.    Deus existe.
b.    Fomos feitos à sua imagem e semelhança.
c.    Jesus é o filho encarnado deste Deus.
Esta é uma visão de Universo muito clara e incontestável para muita gente. Concordo com a “incontestabilidade”, afinal, é logicamente impossível provar a inexistência de Deus. Por outro lado, esta mesma “incontestabilidade” não é suficiente para elevar a hipótese ao fato. Não importa. Não me incomoda, de modo algum, que esta visão de Universo seja abraçada pelos meus companheiros de jornada. Perturba-me, porém, a incoerência entre o propósito que vislumbro neste enredo e os desdobramentos que os crentes lhe deram. Sigam comigo este resumo simples do advento do homem e de Jesus:
Primeiro houve um Deus, em um tempo sem princípio, e este Deus transbordava de plenitude, sabedoria e amor. Ainda que pleno em si, faltava a alteridade, já que todo o amor necessita um objeto, aquele que se ama. Do amor transbordante veio o homem, e da benevolência todo o Universo ao redor do homem apenas para suportar-lhe. O objeto deste amor herdou de seu criador, melhor dizer, de seu Pai, todo o potencial à plenitude, à sabedoria e ao próprio amor. Qualquer estudante conhece bem o princípio físico da potência, a diferença entre energia potencial e energia dinâmica. O Deus que nos ama, fazendo-nos à sua imagem e semelhança fez-nos, por isto mesmo, seres divinos, mas por respeito a nós – “respeito”, para mim, deveria figurar nos dicionários como sinônimo de “amor incondicional” -, deixou tudo o que tínhamos de divino em condição latente, deuses de direito, não de fato. Quem é pai vai entender isto; meu filho tem cinco anos e por mais que eu deseje, não recito Aristóteles para o menino, nem Kant, nem Bergson. Apenas lhe dou dicas de minha visão de mundo, esperando que ele encontre sozinho suas próprias conclusões, que ele evidencie por si seu potencial. Esta é a parte bonita.
A parte feia você vê ao abrir sua janela ou assistir ao telejornal: o mundo é feio. Parece que temos uma inclinação a enterrar cada vez mais fundo nosso potencial divino e manifestar cada vez mais algo completamente oposto a isto. Se há ou não tal inclinação cabe à escolha religiosa ou filosófica de cada um esclarecer. Aí chegamos num ponto no qual Deus, como pai, me superou. Eu, assistindo meu filho apresentar o mínimo desvio daquilo que espero dele, imediatamente lanço mão de toda minha autoridade paterna, imponho restrições, advertências e castigos para evitar comportamentos que me pareçam “inadequados”. Deus, como pai e, sobretudo, autoridade máxima em todo o cosmo bem que poderia aparecer em esplendor e poder tamanhos que cegaria alguns, enlouqueceria outros, e garantiria que jamais houvesse qualquer desvio na população restante. Não o fez; não o faz.
Deus, paciente, sábio, incondicionalmente amoroso, decidiu-se por outro caminho: a Iluminação. Se algo está escuro, ascende uma lamparina; não há treva tão densa que não recue frente à luz da mais frágil vela. Este Deus, ou parte dele ², renunciou ao esplendor e ao poder, renunciou à autoridade; veja que ironia às avessas, aquele que em minha concepção poderia vir para enlouquecer, cegar e governar, curou cegos e loucos, fez-se servo ³. Que estratégia de salvação poderia ser mais bela? Deus se fez homem; vou repetir: DEUS SE FEZ HOMEM. Humano em tudo, menos no pecado, como gostam de lembrar os padres durantes as missas. Mas, por favor, tente observar o que há de mais profundo nesta estratégia – antes, só para garantir que você pegou a chave da coisa toda, DEUS SE FEZ HOMEM.
Um homem, despido de toda a divindade original, passou frio, sentiu fome e sede, suportou o cansaço do trabalho duro, com certeza martelou o próprio dedo inúmeras vezes, cravejou os dedos com farpas até perder a conta. Não havia um campo de força protegendo-o da condição humana. Esta foi a condição estabelecida por ele mesmo: “Serei homem, para mostrar que vocês serão deuses” 4. Cada milagre que tanto te inspira quando visita os cultos de sua religião não foi um milagre feito diretamente por Deus, nem por Deus a pedido de Jesus, nem por Jesus como segunda pessoa da santíssima trindade; cada um destes milagres foi feito por um homem, nascido de uma mulher, com dentes amarelos 5, cheiro forte 6, e roupas simples. Místico demais? Você é cético? Tudo bem, deixemos os milagres de lado, afinal, quem pode provar que ocorreram? Tomemos, porém, este homem e sua mensagem: “Dê a outra face?”,  “Seja manso e humilde de coração”, “Ame o próximo como a ti mesmo”, “Perdoe”, “Perdoe”, “PERDOE”. O convite é para a transformação do coração humano, eis o verdadeiro milagre, eis o único milagre, o resto reduzido a efeito especial para aumentar a vendagem de ingressos para o próximo filme. Perceba a parte mais bela de toda esta história: Um homem amou incondicionalmente, um homem foi plenamente sábio, um homem foi pleno até o fim. Este “um homem” tinha um projeto muito simples, um ideia revolucionária, uma visão clara de mundo e de humanidade e decidiu tornar-se “precedente”.
O fato é que toda a história da passagem de Jesus por este mundo tem um propósito muito simples, mostrar-te, homem, do que você é capaz. Livrar-lhe de sua própria escuridão, iluminar-te para que germine a semente de divindade que guarda escondida há tanto tempo. É por isto mesmo que, para mim, cada vez que vai ao culto ou à missa, cada vez que abre a Bíblia sozinho em seu quarto ou reunido com amigos em um grupo de oração, se tudo o que for capaz de ver ali for um deus caminhando entre homens, você e ele eternamente separados pela natureza intrínseca de cada um, ofende-o profundamente, torna vão todo o sofrimento que ele decidiu viver. Reconheça-o como homem e reconheça-te como divino, então será capaz de dar início ao maior milagre, e cumprirá o propósito iniciado naquela noite em Belém.
Os judeus responderam, dizendo-lhe: Não te apedrejamos por alguma obra boa, mas pela blasfêmia; porque, sendo tu homem, te fazes Deus a ti mesmo.
Respondeu-lhes Jesus: Não está escrito na vossa lei: ‘Eu disse: Sois deuses?”” João 10:33-34

Notas:
¹ Repito, esta não é uma tentativa de refutar estas hipóteses. Nada ganho com isto.
² Se nem Agostinho foi capaz de definir a santíssima trindade, quem sou eu para pleitear sucesso nestas veredas?
³ Preciso explicar o quanto isto é inferior ao súdito?
4 Isto não é citação da Bíblia, antes que alguém venha me pedir para mostrar onde está.
5 Não tinha Colgate naquela época.

6 Eles até tinha óleos perfumados, mas nada de Axe.

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