Nesta manhã tive uma longa e frutífera conversa com meu filho sobre responsabilidade afetiva. Note que eu disse "conversa", não "sermão", pois não se tratava de um debate sobre imperícias dele em suas relações; muito pelo contrário, apesar de jovem, é um menino muito maduro e sábio, dentro dos limites que a idade impõe. Sempre aprendo muito.
Terminada a conversa ele, que conhece meu gosto pela escrita, pediu que eu escrevesse sobre os tipos de amor, pois o romântico é apenas um dentre tantos, do pai pelo filho, do irmão pelo irmão, amor entre amigos, da pessoa pelo cachorrinho etc.
A princípio resisti, pois desde 2021 venho retendo este tipo de texto, conforme expliquei numa postagem curta de 2023: "Tenho um repositório de textos. Tudo que eu publico eu arquivo lá. Eventualmente tenho o impulso de escrever sobre o #Amor . Quase sempre que acontece, uma voz aparece e diz "ainda não!", levando-me a inserir aquela ideia em um arquivo do repositório chamado "Sobre o Amor": uma colcha de retalhos com fragmentos de pensamentos iniciada em 22/07/2021. Um dia, quando a voz sumir, eu publico.".
Ele contra-argumentou dizendo que era sobre os diversos tipos de amor e, como o meu repositório é, preponderantemente, sobre o amor romântico, aquiesci.
O Amor, seja o romântico, seja qualquer outro, é complexo de definir; como eu poderia falar dos diversos tipos de amor sem chegarmos em um entendimento mínimo do que é o amor em si?
Vou propor uma definição curta, incompleta, apenas para tornar possível seguir com o texto. Não é aqui, em parágrafos tão curtos, que vou solucionar tão antiga dúvida de tantos filósofos e poetas. No tempo poderemos discutir e aprimorar nosso entendimento. Concordemos, por ora, que amor é um exercício, mais que um sentimento; é um esforço deliberado e consciente pelo bem do seu objeto, ou seja, pelo bem do ente amado. Precisa ser deliberado e consciente, do contrário, seria mera paixão, o que nos aprisionaria em leituras de amor romântico e expurgaria as outras manifestações. Por outro lado, não pode ser puramente deliberado, posto que temos sentimentos de afeto aqui, desafeto ali, de origem inconsciente e sobre os quais não deliberamos. Paradoxo!
Solucionemos, por ora, o paradoxo, assumindo que o amor é um hibrido, filho de nossas afeições naturais, seguido de nossas deliberações sobre o que fazer com elas. É mais que o afeto puro e menor que a plenitude do amor incondicional (sobre o qual discutiremos oportunamente).
Resumidamente, O AMOR é quando sinto um afeição por alguém ou algo e, deliberadamente, transformo essa afeição em ATO em benefício daquele ente; também É AMOR quando sinto um desafeto e, deliberadamente, contorno essa repulsa inicial e a converto em ATO para acolher aquele ente. Faz sentido?
Ontem (19/10/2024) eu senti (consequentemente, publiquei) o que segue: "Eventualmente tenho vontade de escrever sobre o #amor. Eventualmente, não lembro como o #Amor é. Eventualmente, esquecendo-me, duvido que exista.". Curioso que meu filho, que não me segue, tenha solicitado especificamente este tema.
Acho positivo que, menos de 24 horas depois de minha dúvida sobre a existência do amor meu filho tenha me obrigado, indiretamente, a defini-lo. Se o amor é um ato deliberado posterior ao afeto, ele pode ser construído, assim, minha dúvida sobre a existência se soluciona em minha própria capacidade de criá-lo. O amor é criável! Sua eventual (e momentânea) inexistência é irrelevante, pois pode ser trazido à existência a qualquer momento, por qualquer um.
Bom. Acho que nos entendemos, certo? Uma definição momentânea e precária do amor, só pra seguir. Depois aparamos as rebarbas.
Definido o amor, pensemos em suas variedades.
Eu amo meu filho; Suponho que ele também me amo; A moça da casa em frente ama seu cachorro? Meu vizinho ama seu irmão?
Note que agente passa pelo afeto, o que acaba validando nossa proposta de definição provisória de amor. Quando meu filho nasceu senti afeto por aquela frágil figura em meus braços; o afeto, por si só, é insípido, inútil. Aquela criança não precisava de minhas frases de "Como gosto de você, garoto!", precisava de comida e abrigo. Nota? Do afeto segue (não necessariamente. Segue logicamente, mas nem todos os pais dão esse passo) o ato, a escolha deliberada de cuidar (guarde essa palavra. Cuidado é importante). Isso deve ser o amor.
Quando temos irmãos, somos (acho) tomados por um qualquer afeto por aquela criatura que habita nossa casa, um tipo de amigo imediato, o primeiro amigo. Deste afeto segue (pode seguir) a decisão deliberada de cultivar aquela amizade, donde o eventual profundo amor que irmãos podem guardar entre si por toda a vida. O irmão é (deveria ser. Sei que a minha é) o primeiro amigo.
Uma coisa simples. Vejo um bichinho; um gato; um cão; posso sentir um quê de afeto, um carinho natural pela fragilidade daquele ente; uma ternura pelo seu comportamento; posso sentir e ir embora; OU posso sentir e abraçar a responsabilidade de cuidar, alimentar, limpar etc. É (deve ser) amor.
Tudo isso pode acontecer com irmãos, parentes, amigos, e tantos outros níveis, são tipos diferentes de amor, sem nenhum tipo de hierarquia que definam uns como superiores e outros como inferiores. Não há hierarquia no tipo, mas sim na responsabilidade. Como eu lido com os diferentes tipos de afeto que sinto e de amor que construo?
Novamente, amor é sobre deliberação. Então, repito: Como eu lido com os diferentes tipos de afeto que sinto e de amor que construo?
Vou deixar a pergunta para você processar. Não vou responder. Não sou capaz de fazê-lo. Eu mesmo estou aprendendo.
Vou dar uma dica, que foi uma das conclusões do diálogo com meu filho: "Carinho, um mar de gente pode entregar; beijos, muita gente pode entregar; toque, carícias, muita gente pode entregar; paixão um mar de gente pode entregar; sexo um mar de gente pode entregar; Cuidado, são raros os que entregam!"
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