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quarta-feira, 12 de março de 2025

#Verborragia: Ecos

 A pessoa que selecionou a palavra de hoje não se contentou em sugeri-la; ela incluiu seu próprio sentimento da palavra escolhida, ao dizer que "a palavra carrega múltiplos sentidos—memórias que reverberam no tempo, ideias que encontram ressonância, palavras que nunca desaparecem por completo. Talvez seja um bom ponto de partida para você explorar o que permanece, mesmo quando parece ter se dissipado.".

Não quero seguir apenas o caminho da palavra, mas sim o dos sentimentos adiantados, entretanto, convém iniciar dizendo que me parece particularmente relevante observar que a sugestão foi no plural: Poderia ter sido "eco", mas não foi. Isso dá vida e movimento à sugestão, pois realmente a manifestação sensorial do eco ocorre no plural, na dinâmica da repetição do som propagado; Aquilo que chamamos de eco muito raramente ocorre em repetição única. Um único eco é a repetição, duas vezes ou mais, ainda que em potência decrescente, do som inicial; ecos?

Você poderia se queixar dizendo que a repetição já está implícita no conceito de eco, no singular; sou capaz de aceitar, mas prefiro, por pura arbitrariedade, a opção acima; por outro lado, se aceito seu argumento, nada perco: Convêm agarrarmo-nos ao plural pelo simples reconhecimento de que indefinidos ecos transpassam a nossa existência.

Passemos à análise do caso: Eco e ecos, você sabe, ocorre(m) quando ondas sonoras são rebatidas por uma superfície qualquer e retornam ao emissor, assim, você escuta o som que acaba de emitir; você pode ouvir o eco de um som emitido por algo que lhe é adjacente; em nada isso contradiz a primeira definição. Dá no mesmo. Ora: Não estamos aqui para discutir propriedades das ondas sonoras; debrucemo-nos sobre a análise do que é possível extrair dos "ecos" para um melhor entendimento de nossa existência subjetiva (como é de praxe neste espaço.).

Vou, escrachadamente, converter os sentimentos do primeiro parágrafo em roteiro; vejamos: se os ecos podem ser "memórias que reverberam no tempo", aproveitando a descrição do eco dada há pouco como analogia para nosso relacionamento com a memória, podemos conceber que nossas experiências são "o som que emitimos" e as reverberações na memória são os "ecos"; observe que, em um caso e no outro, a intensidade vai se perdendo, até o ponto em que desaparece completamente. Há, porém, uma característica da memória que não existe no som: algum canto de nosso ser a armazena indefinidamente, mesmo que o ente consciente que eu chamo de "Eu" não tenha acesso imediato à coisa; disto deriva que, não raro, uma memória completamente dissipada no tempo (tal qual o eco que deixou de reverberar) salta para fora de seu misterioso esconderijo, me aparece diante dos olhos e grita "BU!", como se eu retornasse a uma caverna que visitei, anos atrás, e esta, espontaneamente, emitisse minha voz de menino perguntando-me "QUEM É VOCÊ? Quem É Você? quem é você? .... . ....? .? .: .. ."

Se/Quando uma memória destas retorna, o que leva a este movimento? Nem sempre (quase nunca) experimentamos uma saudade ou pensamento que a anteceda e evoque, assim, não é difícil inferir que, na maioria das vezes, seu retorno é espontâneo; um eco com vontade própria. Talvez seja um meio de nosso inconsciente demonstrar que há analogia entre algo do presente e aquela lembrança; ou que há algo pendente de aprender daquela experiência; ou, ainda, que você não largou completamente aquele sentimento, ainda que tenha se esquecido das experiências que o engendraram; só você pode descobrir, com base na sua história e referências, o que significa esse eco.

Se, por outro lado, consideramos os ecos como "ideias que encontram ressonância", então saímos do domínio da memória e entramos no campo da experiência objetiva, presente, mais especificamente, no ato de interação com uma pessoa ou grupo no qual uma ideia que emitimos ressoa e retorna para nós (ou que somos nós a superfície na qual a ideia de outrem ressoa). Não quero ficar na esfera das meras simpatias ou concordâncias superficiais por assunto; prefiro pensar naquilo que algumas pessoas chamam "conexão"; há encontros menos ordinários nos quais a ressonância dos pensamentos transcende a mera concordância de assunto; trata-se de uma identidade da forma de ver o mundo, de pensar; o eco se manifesta como se o outro fosse capaz de pronunciar o que você pensa sem que você o tenha dito; o que você diz ecoa do outro; o que você pensa ecoa do outro antes de você ter a chance de pronunciar; é tão mágico quanto raro (ouvi dizer).

Na reunião de tudo isso, talvez os ecos sejam "palavras que nunca desaparecem por completo.". O eco material dá a ilusão da suspensão do som; uma conexão atribuída a um relacionamento que não prosperou parece dissipar a ressonância ali experimentada; mas sempre há algo que permanece; para além do eco das cavernas, perdido para sempre (ou não), há algo ressoando indefinidamente em tudo o que vivemos, "memórias que reverberam no tempo", e todos os momentos de interação em que, por identidade, suspendemos provisoriamente a grande solidão que é a existência humana, "ideias que encontram ressonância".

Uma(algumas) vez(es) um pseudofilósofo inferiu: "Somos o que lembramos!". Nada nos impede de resgatar o pensamento/sentimento e defender que somos ecos: Eu escuto em mim, em ecos, a voz de cada "Eu te amo!" que eu disse e que eu escutei, e cada "Respire!", e cada "isso não parece a melhor ideia!" e o dia em que um amigo me ensino a pressão ideal para o pneu da bicicleta, e quando um outro me falou de como é melhor o café sem açúcar, e quando me encantei por Jung, em detrimento de Freud, e quando me ensinaram a ouvir lo-fi, e tudo o mais.


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