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quinta-feira, 5 de outubro de 2017

Por que Deus ignora nosso sofrimento?

Numa outra mídia um rapaz perguntou "se Deus é onisciente, como cria pessoas que sabe que serão demônios? Como Hitler, entre outros". Me envolvi no diálogo informando que, supondo a existência de Deus, por amor deveria garantir a liberdade, o que torna possível este tipo de pessoa (caso contrário seríamos autômatos muito bonzinhos). Meu interlocutor compreendeu, mas denunciou (não sem razão) que minha opinião parecia indiferente ao sofrimento das pessoas. A isto seguiu a reflexão/réplica que abaixo.

"(...) Cara, relendo-me percebo que realmente pareci muito frio, mas preciso dizer que há um motivo. Gosto de refletir sobre a divindade, caso exista uma, e criar hipóteses ao seu respeito (enquanto ela não se apresenta de vez para acabar com as dúvidas).
Veja, se nos inserirmos dentro da hipótese da existência da divindade e, com ela, da imortalidade da alma, precisaremos analisar separadamente nossa limitada visão de vida (secular) e a vida em si (eterna).
Considerando que hoje tudo o que sei da vida se resume ao terço de século que vivi e à pouco espectativa de superar os cem anos, todos os períodos de sofrimento que eu tive são imensos. Outras pessoas tem ainda menos tempo de vida vivida ou menos tempo de espectativa e já experimentaram sofrimentos muito maiores (se é que podemos falar em medida para sofrimento).
Por outro lado, será que toda a dimensão dada ao sofrimento não é definida justamente pela sua proporção dentro de nossa mente, que é invariavelmente secular? E depois da morte (lembre que estamos numa hipótese na qual a imortalidade da alma não é contestada), qual seria o peso de três quartos de século de sofrimento ao lado de uma eternidade de bem aventurança? (inferno omitido para coerência do raciocínio)
O sofrimento desta vida, frente à qual a indiferença da divindade tanto nos (ou me) perturba, seria irrelevante até para nós. Uma picada de vacina imprescindível para uma eternidade saudável. Tomariamos uma café celestial e ririamos comentando "lembra quando discutimos 'sofrimento' pelo celular?" e ririamos pela ignorância infantil já superada."
A réplica terminou aí em "superada", porém, quero aproveitar para reforçar a figura da vacina. Sou pai e, como tal, a maior parte de meus empreendimentos, esforços, energias, orbitam a manutenção da felicidade e bem estar do meu filho. Ora, desejar felicidade para alguém é, invariavelmente, querer também remover qualquer sofrimento. Uma vacina ou outra injeção causam dor, são formas de sofrimento. Por outro lado são meios necessários para a prevenção ou reversão de sofrimentos bem maiores. Nenhum pai em sã consciência (há pais sem sã consciência. Lamento) pouparia o filho destas dores menores, pois estaria consciente da urgência de repelir as dores maiores. Noutras palavras, mesmo o mais profundo desejo de remover o sofrimento pode estar associado à necessidade de incutir algum sofrimento. O pai o faz, às vezes com o coração partido, mas sem remorso. A criança não está consciente daquela necessidade, mas o pai está. A criança pode até se sentir enganada, mas quando amadurecer compreenderá. Disto deriva uma  verdade que, embora dual, é muito simples:
* Na hipótese da inexistência de qualquer realidade metafísica o sofrimento é aleatório e é nosso o dever moral de, na posição de pais da humanidade, expurga-lo ou dosa-lo para uma existência harmoniosa geral.
* Na hipótese da existência de algum realidade metafísica (um Deus, vários deuses, leis cármicas, etc.) devemos remover o véu de ignorância que clama pela misericórdia divina e, espiritualmente emancipados, distinguir os sofrimentos necessários e desnecessários e então, como co-autores da existência, assumir o nosso dever moral de expurgar os desnecessários e dosar os imprescindíveis para uma existência harmoniosa geral.

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