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Há anos ocorrem ricos diálogos sobre Civilização Humana e Filosofia, Teologia, História e Cultura em geral! Tudo que possa interessar a alguém que espera da vida um pouco mais que outra temporada de BBB! Após diversos convites a tornar públicos estes diálogos, está feito! Quem busca uma boa fonte de leitura, por favor, NÃO VISITE este site. O que esperamos, de fato, é a franca participação de todos, pois não se chama “Outros Discursos”.

sábado, 11 de fevereiro de 2023

#Verborragia: Califórnia

Em minha infância existia um jogo, no falecido console Master System, denominado "Jogos de Verão"; Só na adolescência aprendi que nem sempre os jogos (ou filmes) chegavam no Brasil com o nome original; foi aí que descobri que o verdadeiro nome daquele jogo era "Califórnia Games".

Eu consigo imaginar um diálogo na área de marketing da TecToy e alguém defendendo a tese de que "Califórnia" talvez não evocasse nada para a maioria do público daquela época e não havia uma internet para pesquisar; "Jogos Cariocas" pode ser um título sugerido por alguém em um canto, ao que se contestou dizendo "Faz sentido. É coerente. Mas precisamos alcançar o país inteiro", "Então coloca 'Verão' de uma vez!", e assim se fez.

Não quero falar sobre tradução, marketing ou jogos, mas eu precisava explicar porque a palavra "Califórnia" me levou ao destino deste texto: Deleite ¹.

O jogo (com toda a insuficiência que a tecnologia da época permitia) enchia os olhos com praias movimentadas, gaivotas e ondas gigantescas. Era uma espécie de reverência à ideia de verão, leveza e esportes por diversão; chega a ser irônico pensar que daí (não deste jogo em particular, mas dos jogos eletrônicos em geral) nasceria toda uma discussão sobre sedentarismo e a necessidade de reduzir o acesso aos eletrônicos para fomentar atividades físicas; irônico (2.0) que logo em seguida estes jogos seriam promovidos a e-sports.

Não é de ironia que quero falar.

Vivemos uma época de devoção à saúde (ou, na maioria das vezes, devoção à estética disfarçada de preocupação com saúde) na qual há ampla e crescente busca pelas atividades físicas; academias "pipocam" pelos bairros e só perdem em volume para igrejas protestantes e adegas; custeio de academia passou a ser diferencial nos benefícios que os RH's podem oferecer. Não vou fazer apologia à atividade física, tampouco tecer críticas sobre fins e métodos (alguns muito insalubres); a mim compete evocar as alegrias dos "Jogos de Verão" para dar um passo para trás, subtrair do quadro os árduos e repetitivos exercícios de academia (satisfatórios, quase sempre, apenas pelo vício em dopamina, serotonina e afins) e pensar em esporte em sua origem e motivação mais trivial: promover diversão e interação.

A atividade esportiva, em sua raiz, tem como meta a busca da satisfação imediata na brincadeira e a satisfação um pouco mais tardia na conquista de excelência. Ainda que seja difícil abstrair da busca pela excelência estética (e tal busca não é moderna), parece-me que o deleite é maior com a habilidade que se pode obter e demonstrar, em detrimento da imperícia geral; noutras palavras, as habilidades práticas tem muito mais valia, para muitos, que a estética corporal, sendo esta um efeito colateral.

Para muito além das grandes mestrias assistidas na história do esporte (e tantas outras potencialmente superiores, perdidas para sempre por terem ocorrido em lugar ou época em que não era possível registrar) existe a indiferença à mestria, ou melhor, o desejo aberto de obtê-la despido de constrangimento por qualquer imperícia. Para além dos grandes eventos televisionados há os esportistas por gosto, por amor, por deleite. Buscam o esporte pelo prazer que este proporciona e não se deixam intimidar por erros no processo. Bola fora, tabela errada, barrigada na água, queda do skate, etc., nada é motivo para parar, tampouco se constranger, pois todos ali erram e todos ali compartilham do mesmo carinho pelo processo: O Processo vale mais que a perfeição.

"Garota eu vou pra Califórnia...", disse Lulu Santos, descrevendo uma série de características para a vida pretendida. O processo de viver, assim como o processo do esportista amador, precisa ser amado pelo que ele é, não pelo que pode vir a ser. Isto não é um convite à irresponsabilidade, seja no esporte, seja na #Vida; trata-se de um convite à simplicidade e profundidade do presente, sem deixar de lado os cuidados necessários para promover um futuro igualmente satisfatório e seguro. Ao contrário dos excessos existentes no esporte profissional (notadamente no futebol) e as lesões frequentes, o esporte amador volta-se a um modelo de menor agressividade e maior periodicidade; isso não é garantia de ausência de lesões, mas é uma forma de ser mais simpático com seu organismo e buscar um equilíbrio entre o prazer e o esforço. O mesmo deveria ser aplicado para a vida, de modo a construir/obter um equilíbrio no processo: excesso de/no presente pode causar desastres que impossibilitem o futuro; excesso de/no futuro pode tornar o presente tão desastroso que não haverá mais um "eu" saudável para gozá-lo; Noutras palavras, uma postura totalmente fixada no presente, em satisfações imediatas, pode deixar o futuro complicado (quiçá impossível), entretanto, um fixação desmedida no futuro, com a total anulação de si no presente (não confundir com ficar parado devaneando; refiro-me a um presente totalmente vivido em função da construção de um futuro, sem qualquer deleite no momento em que se está, consumindo-se na construção até definhar) pode garantir um futuro excepcional, mas um indivíduo destruído, incapaz de desfrutá-lo; é preciso, repito, equilíbrio.

Na vida, no esporte e nos jogos eletrônicos há de se reparar um fato curioso: A importância (quiçá imprescindibilidade) da Responsabilidade ². Você já viu crianças brigando em função do mal comportamento de um participante da brincadeira? Veja! Brincadeira é brincadeira, mas no universo infantil brincadeira é coisa séria; precisa ser levada a sério. Percebe? A brincadeira é um ato e momento de deleite, mas não é despida de regras, assim, se o deletei de alguém baseia-se no descumprimento das regras o deleite geral é comprometido. Não. Não vou fazer sermão aqui. O ponto ainda é a responsabilidade. Se/quando criança, ao entrar em uma brincadeira as regras pré-definidas são imprescindível para que a diversão se estabeleça de forma saudável. É um curioso (semi)paradoxo de que a diversão dependa da seriedade. Tudo isto para dizer que a responsabilidade não reside no ato de abraçar a chatice, a monotonia; é preciso ser divertido, mas a diversão não pode ser demasiadamente ampla, a ponto de onerar outros e até a si mesmo (agora e/ou no futuro), a diversão precisa ser realizada com compromisso e seriedade: #Responsabilidade.

Ao assumir responsabilidade sobre seus atos presentes você opera para que que não sejam causa de desastre no presente e no futuro seu e dos outros. Ao assumir responsabilidade sobre seu futuro você opera para que seu presente não seja irresponsável, pois é capaz de vislumbrar a relação causal entre o agora e o depois. É isso. Deleite e Responsabilidade.

Mudemo-nos ou não para a Califórnia, a vida é para ser vivida sobre as ondas, passando tão lentamente que mal se nota a saudade do que quer que seja. A vida até aqui foi boa! Neste momento está boa! Operemos para que permaneça assim!

Notas:

1. Ainda sobre deleite, leia #Bacon 

2. Leia "Responsabilidade! Hora de despertar!" 

Para entender o motivo da Verborragia clique aqui (Participe! É grátis e fará um [pseudo]autor muito feliz! )

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