Os textos das quartas (reflexões) são mais complicados que os das sextas (contos), pois necessitam de conteúdo que me convença. Há palavras cujos primeiros vislumbres de conteúdo não me agradam, justamente por serem tão exaustivamente discutidas que sobra pouquíssimo espaço para alguma originalidade. O que falar dos Jovens?
Ainda que idades mais avançadas possam ser (de fato, são) altamente prolíficas em produções de qualquer natureza, é preciso reconhecer que a originalidade é o império da juventude. Uma mente mais antiga tende a ser desconfiada; mesmo quando tem algo inédito para produzir ou apresentar o faz timidamente; caminha devagar, tateando o solo à frente para avaliar se é seguro.
Os jovens se lançam apaixonados a tudo que lhes encanta, tudo que lhes cativa, para o bem e para o mal.
Não me cabe julgar o valor dos sonhos, objetivos e projetos: não estou aqui para impor qualquer metodologia para justificar certas empreitadas e desencorajar (ou mesmo condenar) outras. É possível que justamente a altíssima variedade de caminhos buscados é que torne tão rico e abrangente o universo de constante novidade que daí resulta (repito: para o bem e para o mal).
Os jovens são movidos por uma fé profunda; não me interprete mal, estou falando de fé, não de religiosidade. Há, é claro, uma grande parte da juventude envolvida em movimentos religiosos e/ou místicos, mas a fé se aplica até aos céticos; mesmo aos ateus ¹ . A Fé não necessita de metafísica; não necessita de divindades interferindo na vida dos indivíduos; a fé refere-se à confiança na veracidade e eficácia da ideia que se defende e os jovens são movidos por uma fé profunda.
Quando a vida alcança certo tempo de duração e você já se lançou com uma fé muito profunda em um volume crítico de coisas que não eram verdadeiras ou eficazes a "fúria juvenil" se aplaca; há uma serenidade semitriste por assistir algumas coisas perdendo o encanto; parte do mundo perde a vivacidade de suas cores (não necessariamente as cores). Não estou lamentando; não perdemos a capacidade de nos encantar, de nos apaixonar por algo ou por alguém, apenas tornamo-nos menos desesperados por estas ocasiões; mais seletivos; não há pressa. Mas este texto não é sobre os "jovens a mais tempo".
Aos jovens tudo é permitido e tudo convém (esperava que eu evocasse a Bíblia? Se liga parceiro)! Se me é facultado um momento de chatice, gostaria de lhes recomendar apenas responsabilidade: moral, financeira e afetiva (principalmente afetiva).
Se falamos de pecado minha orientação é "foda-se"; mas se falamos do risco de ferir outros (moral, financeira ou afetivamente) eu gostaria de te pedir cuidado; não te custa nada e facilita a vida de todos; sendo a juventude um lugar de fé, não seja você o demônio a aniquilar a fé dos outros. Que tal?
Superado o pecado e confiante que você é/será responsável, o que nos resta? Originalidade.
Imagine que a humanidade é um grupo de pessoas residindo no interior de uma esfera oca; a esfera precisa se mover para alcançar certos lugares, mais ou menos favoráveis para a comunidade ali dentro, conforme cada tipo de lugar. Os "menos jovens" tendem a ficar sentados, impedindo ou retardando o movimento da esfera, ou se organizam para empurrá-la em direções repetidas, por se sentirem seguros naqueles caminhos.
Há riscos nos caminhos inexplorados? Claro que sim, mas também há belezas inimagináveis, riqueza e alegrias; cabe aos jovens forçar o movimento da esfera em novas direções.
Em um mundo ideal a comunidade resolveria harmonicamente pelos melhores caminhos e empurraria em união em um processo de evolução/avanço constante; na vida real sabemos que não é assim; aos jovens cabe/resta a agitação de lançarem-se freneticamente às direções que sua fé profunda lhes convida, esbarrando com força nas paredes da esfera e, com isso, influenciando mais ou menos a sua direção; vez ou outra são poucos em certo caminho e, consequentemente, a esfera segue impassível na direção oposta; noutras ocasiões, por acidente ou identidade, se organizam com maior volume ou força e finalmente conduzem a comunidade inteira para novas paragens.
É um processo lento, eu sei, repleto de ziguezague, idas e vindas, avanços e retrocessos, mas, por ora, é tudo o que temos; se isso não basta, que os jovens aprimorem o processo. É seu direito e dever lançarem-se apaixonados em tudo o que é novo; a originalidade é seu império.
Notas:
1. Leia Uma Questão de Fé
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