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Há anos ocorrem ricos diálogos sobre Civilização Humana e Filosofia, Teologia, História e Cultura em geral! Tudo que possa interessar a alguém que espera da vida um pouco mais que outra temporada de BBB! Após diversos convites a tornar públicos estes diálogos, está feito! Quem busca uma boa fonte de leitura, por favor, NÃO VISITE este site. O que esperamos, de fato, é a franca participação de todos, pois não se chama “Outros Discursos”.

quarta-feira, 5 de janeiro de 2022

Amadureci?

      Um amigo (nome omitido para não expô-lo) publicou numa mídia social a seguinte pergunta "Me tornei uma pessoa mais espiritualizada ou só amadureci mesmo?". Embora não fosse uma pergunta dirigida a mim (era uma publicação geral), acabei me metendo, donde o impulso para a presente reflexão. O próprio dono da pergunta analisou o caso (praticamente se respondeu) e o aprofundou, constatando que assim como o processo espiritual poderia tê-lo ajudado a amadurecer há quem amadureça sem processo espiritual. Vamos passear pelas hipóteses.

      Antes de mais nada, se pensamos em espiritualidade precisamos definir o escopo de nosso entendimento de "espírito". Não me é facultado demonstrar elementos metafísicos relacionados à ideia de espirito, tais como sua intangibilidade, sua indestrutibilidade (ou seja, existência fora e/ou depois do corpo material), sua multidimensionalidade, etc. Pouco importa. Demonstrável ou não, tangível ou não, é indiscutível haver um elemento em mim que não é material e que está, neste momento, narrando/elaborando este texto para que minhas mãos distribuam as ideias pelo teclado. Se ele é eterno ou se morrerá com este corpo não interessa. O elemento subjetivo está aí, governando meu corpo, interagindo com o mundo, temendo, amando, etc. Se você acredita em transcendência, chame-o de "espírito". Se você é (ultra) materialista chame-o simplesmente "mente", ou vai me dizer que o objeto de estudos da psicanálise torna-se desprezível se você não for religioso? Parece ser justamente o contrário, não?

      Se conseguimos chegar em um acordo de que "espírito" pode/deve ser aceito como presente mesmo se/quando expurgamos a fundo metafísico,  poderemos refletir sobre ele sem precisar recorrer a premissas transcendentais, religiosas, místicas, etc. (o que não significa que eu os abomine. Ocorre que esta reflexão precisa ser técnica, portanto, despida me minhas inclinações particulares). Recapitulando, apenas para garantir que não nos perdemos, há uma voz na sua cabeça que narra este texto em português enquanto você passeia os olhos pela tela; Essa voz também te diz "Estou com fome", "Saudade da morena", "Ai meu Deus! A roupa no varal!", "O que que eu vim buscar mesmo?", etc., e você convive com ela sem qualquer grande conflito existencial. A aceita, a assume e a chama de "eu". Quando precisa falar dela diz "Minha mente", "meu consciente", "Minha consciência", "Minha alma", "Meu espírito", etc. Não importa a nomeação. Não importam suas bases filosóficas, religiosas, científicas, etc. A presença da voz é incontestável. Aqui vou chamá-la de "espírito" e enquanto a voz continuar com você não será possível negar que há um "espírito", não importa o que seja ou onde resida. De acordo?

      Eu (e meu espírito) não existo (existimos) estático(s) no tempo. Passeamos pelo tempo enquanto o corpo não perece. Chamamos isso de vida. No decorrer desta aprendemos algo, esquecemos algo, mudamos. Esse processo de perda e aquisição não é necessariamente positivo (ou seja, nem sempre é um progresso), mas quando é chamamos de "amadurecimento". Ora, se concordamos que necessariamente há um espírito e que ele sou eu, o processo de amadurecimento é necessariamente espiritual: o que amadurece é o meu espírito, não minha unha, meu cabelo, meu cérebro, etc. Nenhuma parte do meu corpo amadurece, apenas envelhece (com mais ou menos qualidade, conforme cada estilo de vida). O amadurecimento, quando ocorre, é em minha subjetividade; em meu espírito.

      Se fossemos parar por aqui poderíamos inferir que a resposta à pergunta inicial é que os atos são simultâneos; vendo com atenção nem isso, porque não estão ocorrendo em pontos distintos e paralelos do "eu"; Na verdade são (seriam) um único e mesmo ato.

      Mas a pergunta não era sobre "espírito" e "amadurecimento", era sobre ser/tornar-se espiritualizado. Eis o pulo do gato. Todos somos/temos espírito; nem todos amadurecemos; algo muito menor que "nem todos" se espiritualiza. O que é espiritualizar-se? Você abre sua janela (da casa ou do computador) e vê um mar de gente religiosa. É intuitivo (na verdade, escrachado) que ser religioso não tem qualquer relação causal com "espiritualizar-se", tampouco com "amadurecer". Descartemos de cara a religiosidade; que ninguém saia daqui pensando que evoluiu por ter ido à igreja ou que precisa passar a fazê-lo (o que não quer dizer que lhes impediremos).

      Se, por um lado, não posso romper a dupla "espírito+amadurecimento" (se há espírito ele pode amadurecer; se há amadurecimento foi necessariamente um espírito que o fez), o elemento "espiritualizar-se" é totalmente prescindível (acho que não. mas vai fazer sentido). Troque "prescindível" por "opcional". Eu tenho/sou espirito com ou sem espiritualização; eu posso amadurecer com ou sem espiritualização; o que é espiritualização e qual seu papel nisso tudo?

      Tomando como premissa TUDO o que discutimos até agora (portanto, ainda descartadas as explorações metafísicas e expurgada a religiosidade), "espiritualizar-se" nada mais é que assumir responsabilidade consciente (não necessariamente diligentemente) pelo próprio amadurecimento. Só isso! Tudo isso!

      Erra aqui; Esquece ali; Toma umas "brejas" acolá (não tem pecado nesse processo, parceiro. No máximo atraso), e está tudo bem. Resolvemos a dúvida inicial? Não. Você amadurece por ter-se espiritualizado ou decidiu espiritualizar-se após algum amadurecimento? Curioso não? Essa pergunta não é passível de resposta, pois o trajeto é único para cada pessoa. Um sujeito pode, após amadurecimento por outras vias, decidir catalisar este processo pela espiritualização; outro sujeito pode esbarrar acidentalmente com a espiritualização (enquanto estava perdido em religiosidade, por exemplo) e iniciar o amadurecimento; infinitos graus e combinações disto são possíveis. Amadureçamos! Divirta-se no caminho!

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